Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

31 agosto, 2007

GERÊS


É verdade, meus companheiros de viagem. Habituei-vos no fim das nossas caminhadas a oferecer-vos umas palavras e umas frases, com a pretensão desmedida, de ser escrita que se possa ler. E, para não faltar à regra, aqui estou após a nossa chegada a tentar dizer-vos o que me vai na alma, mas desta vez, num relato em forma de diálogo, não sei se comigo próprio se ainda convosco. Sim, porque naquelas imensas horas em que caminhamos, mesmo sem conversarmos há um diálogo com cada um de nós. Como se recordam, estava a precisar de uma caminhada, um mergulho no interior daquele verde, daquela massa granítica fundida no princípio dos tempos, naquela sensação de aventura que nos leva sempre para lá da última fronteira. E assim parti, na procura de encontrar matéria para os sonhos que me alargam os infinitos, quer sejam do domínio da terra ou do céu. Se bem se recordam ia soçobrando no primeiro quilómetro, quase traído pelas pernas ou pelo estômago, vá-se lá saber e, pensei que tal como a alma que iria ser o momento de ficar só. Mas, acreditamos, é preciso acreditar sempre e ir um pouco mais além, pelo que entramos naquele desfiladeiro já nosso conhecido, desta vez com a diferença de que o encontramos, em pleno Verão, verdejante, de plantas, de árvores e de água límpida. Penso que foi no sossego daqueles quilómetros em que passamos quase escondidos entre a vegetação que entrei em devaneio e dei asas à imaginação, pelo que passei para o reino da fantasia com duendes, fadas e rainhas. Sim, havia pelo menos uma rainha que enchia a paisagem e quando à vista daquela rocha alva imensa iniciamos aquela íngreme subida que nos levaria duas imensas horas a chegar ao topo, voltei àquele reino que de manhã me havia saído ao caminho. Que fazia eu naquele reinado, onde não posso ser, nem príncipe nem rei, nem mero artesão, apenas um simples e anónimo soldado com a missão de construir, de ser útil, de passar entre a massa incógnita dos que morrerão um dia nos campos de batalha. A subida era extraordinária, era ela também uma imensa batalha, não contra a natureza, mas fazendo parte dela própria, integrando-nos na paisagem como sempre ali estivéssemos. Chegados ao cume quase não queríamos crer no que acabávamos de vencer e quando reiniciamos o caminho, percebemos de novo que voltamos a ser passageiros da eternidade. A chuva, deteve-nos o passo naquele prado quase preparado para nos receber e no momento em que num intervalo das nuvens, a lua cheia nos beijou de luz, julguei ver a imagem do poema quando dizia, de quién es aquele cavalo que vay en el aire galopando? Ah!, mas o cavalo era de Federico, sim, Garcia Lorca, estupidamente assassinado pelos homens na Vega de Granada. Granada, a cidade que desejo visitar, lá estava ela descendo naqueles raios espectaculares da trovoada que caía. Adormeci ao som desse cântico que chamava para Deus do alto da mesquita de Córdova, a árabe. Ou foi aquele vento nocturno que soprava por todo aquele planalto que nos acolheu, ou a fadiga do dia, a rainha regressou aos meus sonhos e eu, mero soldado dessa imensa massa sem nome, dei-me ao desplante dos prazeres da sedução. O amanhecer brilhante trouxe a desilusão de sentir longínquo esse reino que não é meu e quando a chuva persistente nos obrigou a baixar, sentimo-nos ainda uma vez mais, conquistadores, aventureiros, donos de todas aquelas alturas. Talvez tivéssemos voado, já não sei, como aquelas aves altas que vemos ao longe. Ainda vimos um lama de pedra, como aqueles animais altivos que povoam os Andes e os castelhanos quase dizimaram. O cansaço começava a mostrar as suas cicatrizes, mas quando a luz do sol voltou a dançar sobre o caminho, esquecemos tudo e renovamos as energias. O banhar de alguns nas margens do rio, o almoço descansado e o regresso, enfim, transportavam já uma certa nostalgia pelo que tínhamos vivido em todas aquelas horas juntos e já pensávamos onde nos levará a próxima caminhada. Mas, ao chegarmos ao Arado e olhar todas aquelas árvores nórdicas com ar de cedros, voltei a ver por entre aquela floresta a rainha dos meus sonhos com pétalas amarelas coroando o cabelo. Ainda colhi uma daquelas flores violetas e enviei num sopro de vento. Terá chegado ao destino?

21 agosto, 2007

POESIA AO AMANHECER


Bom dia, meus Amigos

Estava eu ontem à noite num intervalo do estudo do Contrato a lutar contra o sono e olhando à volta, pensando que os meus tectos estão cheios de humidade e a carecerem de uma pintura no Verão e a pensar noutras incomodidades da minha casa, quando dei conta que apesar de tudo ainda tenho um mundo muito grande ao poder regressar àquele local todos os dias, poder abrir a porta e sentir um mínimo de conforto, pese embora continuar a faltar-me demasiadas coisas. Contudo, pensando nas centenas de milhões de seres humanos com os mesmos direitos que os meus, que não têm, nem chegarão a possuir esse mesmo conforto, dei conta que a caminhada do Homem à procura da felicidade ainda é demasiado longa e por muito que lutemos, muita coisa ainda vamos deixar por fazer. Não desanimemos, entretanto.

"Eu te nomeei rainha
Existem mais altas do que tu, mais altas.
Mais puras do que tu, mais puras.
Mais belas do que tu, mais belas.

Mas tu és a rainha.

Quando vais pelas ruas
ninguém te reconhece.
Ninguém vê a coroa de cristal, ninguém vê
o tapete de ouro vermelho
que pisas por onde passas,
o tapete que não existe.

E apenas apareces
cantam todos os rios
em meu corpo, as campanas
estremecem o céu,
e um hino enche o mundo.

Somente tu e eu,
somente tu e eu, amor meu,
o escutamos.

PABLO NERUDA, "Os Versos do Capitão", in "Presentes de um Poeta"

"As pessoas grandes nunca percebem nada sozinhas e uma criança acaba por se cansar de ter que estar sempre a explicar-lhes tudo."

ANTOINE SAINT-EXUPÉRY, in "O Principezinho"

"A possibilidade de uma derrota dos EUA, com consequências potencialmente devastadoras para o sistema de dominação imperialista, começam a ser tema de comentários preocupados na comunicação social do sistema"

JORGE CADIMA, Professor

PS - Saint-Exupéry desapareceu sobre o mar no sul da França em Julho de 1944 quando efectuava uma patrulha de reconhecimento preparando a invasão aliada de Agosto. O seu corpo nunca chegou a ser encontrado. Ontem, foram encontradas partes do seu avião de caça.

Porto, 07 de Abril de 2004

20 agosto, 2007

POESIA


Para que tu existas

Ainda os alvores da manhã pairavam adormecidos
os sonhos deixavam-se iluminar por um luar intenso
e já percorria os caminhos da montanha
colhendo flores para te oferecer
enquanto os ribeiros murmuravam sussurros e
as suas águas desciam leitos sem fim.

Já não há galáxias de estrelas no oceano do céu
trinta e três pontos na escuridão
faziam nascer chamas de oiro no horizonte
e crescia o dia que é único
porque só tu nele existes.

Vinte e seis de Setembro de um ano qualquer
e de todos os anos da vida
para que tu existas, para que eu te conheça.

Aconchego-te entre os braços da memória
beijo o teu olhar imenso
invoco a eternidade para me refugiar na tua beleza de princesa.

Aperto nas mãos os lírios colhidos no nascer da madrugada
espero que chegues para florir o teu cabelo
e levar-te nas asas de gaivotas marinhas
a navegar pelas areias de praias desertas.

Hoje quero-te só para mim
mergulhar serenamente nos lagos profundos dos teus olhos
abraçar o teu sorriso e guardar entre as minhas
as tuas mãos carregadas de ternura.

Hoje as lágrimas são rios de esperança
estarei contigo até que o sol pereça
e direi em todos os minutos as palavras proibidas
para que o teu dia também possa ser meu.

Porto, Setembro de 1997. A sexta das Canções Desesperadas

19 agosto, 2007

LEITURAS


Num tempo de intolerância foi-me proporcionada a leitura de um livro sensível, de traço simples e leitura fácil, em que um árabe procurando contar a história do islamismo a uma criança, acaba a contar em tons breves a história do mundo árabe ao longo dos séculos, abordando a sua vertente cultural e religiosa como símbolos e sinónimo de paz e de vivência pacífica.
Na verdade, a leitura de “O Islão explicado às crianças confortam-nos com essa ideia de que do norte de África e do Oriente Médio não saem nem se exportam milhares de suicidas ou de fanáticos que elegem a morte como caminho para a liberdade. A violência neste espaço cultural deve ser procurada noutras razões e noutras causas. Se nos debruçarmos um pouco sobre o comportamento dos europeus desde a queda do império otomano até aos nossos dias com esse apetite voraz pelo petróleo e hoje também pelas jazidas de gás, indiferentes às ondas de miséria que vão deixando pelas areias do deserto. Se lermos com cuidado e atenção as palavras que ao longo dos dias Tahar Ben Jelloun vai deixando às crianças, talvez possamos ver com um olhar diferente quando nos falarem de integralismo islâmico, de suicidas ou de fatwas. Herdeiros de uma cultura ímpar, os povos árabes, merecem que os contemplemos com respeito e capazes de despir os nossos quadros mentais e tentemos compreender o que é diferente. Por mim, venho fazendo um esforço nesse sentido.

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