Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

27 outubro, 2011

POESIA

Procuro,
no horizonte os barcos que navegam os sonhos
procuro,
as velas voltadas para o amanhã
procuro,
o silêncio que me falava de ti
procuro,
no vento a estrada em que viajava ao teu encontro.
Já não
vejo as noites escuras onde brilhavam os teus olhos como estrelas
já não
sei do mar cujo azul era o reflexo do teu sorriso
já não
encontro na natureza a beleza que morava no teu rosto.
Perdi
os contornos do caminho que me levavam a ti.

26 outubro, 2011

POESIA AO AMANHECER



Bom dia, meus Amigos

Regressei a estes silêncios matinais. Por agora não vejo o brilho do azul do céu, com aquela luminosidade que nos faz lembrar os campos do sul. Está cinzento, mas calmo, apaziguador mesmo, e os tons de verde das copas das árvores, daqui só lhes vejo o cimo, dão uma certa monotonia a esta paisagem urbana que paira sobre o ruído, a confusão e a pressa de quem caminha sem ter tempo de olhar à sua volta. Por aqui vou tratando os sinistros. Sim, os acidentes de automóvel para os quais tive sempre um fascínio atractivo como se possuíssem um imã magnético. Na averiguação e análise, seduzem-me os comportamentos, o quadro mental que os intervenientes vivem, mas sobretudo aqueles que acabam por desenhar a bel-prazer das suas necessidades. Chega a ser espantosa a sua capacidade de mentir, de adulterar os factos. De tal forma que há um momento que já só acreditam no acidente que recriaram e duvidam daquele que aconteceu. Atrevo-me a dizer que os portugueses têm uma compulsão para a mentira. Não vou dizer como alguns diziam há dias que não aprendemos matemática por razões genéticas. Não, não vou porque a burrice só é genética quando a cultivamos como um paradigma ao longo dos tempos. Vou antes dizer que nos acidentes de viação, mentir, para além de nos ser útil, é quase um conforto, uma forma de termos uma segunda intervenção de continuarmos actores de uma peça que desejamos original. E como eles tão bem mentem, mesmo quando os olhamos nos olhos e eles vêem que já percebemos que estão a mentir. É esse o momento em que desfraldam a vela, sopram o vento e seguem em frente à bolina realçando as suas virtudes morais e éticas com aquele argumento eloquente e devastador de que “eu quando tenho um acidente assumo sempre as minhas responsabilidades por muito que isso me custe”. É este o instante em que sentimos que a magia alcança o rubro e nos desarma em absoluto. Rendemo-nos perante tanto encanto. Portugueses! São assim os meus compatriotas e mais espantoso é que no meio desta palermice chegam a ser sedutores. Ditosa pátria que tais filhos tem, escreveu o Camões com aquela pena que conhecemos.

KASSANDRA

Homens, barcos, batalhas e poentes,
Não sei quem, não sei onde, delirava.
E o futuro vermelho transbordava
Através das pupilas transparentes.

Ó dia de oiro sobre as coisas quentes,
Os rostos tinham almas que mudavam,
E as aves estrangeiras trespassavam
As minhas mãos abertas e presentes.

Houve instantes de força e de verdade -
Era o cantar de um deus que me embalava
Enchendo o céu de sol e de saudade.

Mas não deteve a lei que me levava,
Perdida sem saber se caminhava
Entre os deuses ou entre a humanidade.

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in “Cem Poemas de Sophia”

Dizia a mim próprio, com revolta, que a natureza é injusta para com aqueles que obedecem às suas leis mais claras, visto que cada nascimento põe duas vidas em perigo. Cada um de nós faz sofrer, quando nasce, e sofre quando morre. Mas não tem importância que a vida seja atroz; o pior é ela ser inútil e sem beleza.

MARGUERITE YOURCENAR, in “Alexis ou o Tratado do Vão Combate”

“Em nome da luta contra a imigração clandestina, a 12 de Maio o governo francês reforçou as disposições repressivas contra os imigrantes – e não contra os que se servem deles. Para este fim, criou um Gabinete Central de Luta Contra o Trabalho Clandestino, ligado ao Ministério do Interior. No entanto, tal como é demonstrado por um relatório oficial mantido em segredo, o próprio Estado dá cobertura a redes legais.”

PATRICK HERMAN “Tráficos de mão-de-obra cobertos pelo Estado ”, in “Le Monde diplomatique”, Julho de 2005

Porto, 11 de Agosto de 2005

24 outubro, 2011

LEITURAS



O escrivão público nas sociedades tradicionais, é aquele que redige cartas, preenche formulários e requerimentos pelos que não sabem escrever, a troco de algumas moedas. No entanto, para Tahar Ben Jelloun, ele é sobretudo aquele que empresta a escrita e a voz ao seu povo, aos que não podem falar.
Livremente evocando memórias e imagens de cidades de um Marrocos às vezes real, outras imaginário, Tahar Ben Jelloun narra, neste livro, a violência da vida e a experiência da pobreza, numa sociedade dividida entre Ocidente e Oriente, entre tradição e modernidade.
Tahar Bem Jelloun é um mestre a contar histórias. A sua escrita concisa, plena de imagens poéticas e místicas, envolve o leitor no seu universo mágico.


Tahar Ben Jelloun. Escritor marroquino de língua francesa e um dos nomes mais consagrados da literatura contemporânea, recebeu inúmeros prémios dos quais se destacam o IMPAC e o Goncourt. A sua obra está traduzida em todo o mundo.
Ben Jelloun nasceu em Fez em 1944 e actualmente vive em Paris.
Após terminar estudos universitários em filosofia, parte para França em 1971 e, na Universidade de Paris, recebe o doutoramento em Psiquiatria Social.
Apesar da origem árabe, Ben Jelloun optou espontaneamente por escrever em francês. O seu bilinguismo é parte integrante da sua vida, assim como tema presente na sua obra. No seu universo literário é recorrente a criação de cenários e enredos plenos de contradição entre tradição e modernidade, entre o mundo árabe e o mundo ocidental.
Toda a sua obra está povoada de personagens marginais, à procura da sua identidade social e sexual, o que reflecte o seu interesse pela sexualidade e suas disfunções.
Da sua extensa obra, que inclui romances, poesia, peças de teatro e ensaios, destacam-se: L’enfant de sable, La nuit sacrée, Les yeux baisées ou Le racisme explique à ma fille.


Estou em crer que muitos de nós quase sempre guardamos dos árabes, uma ideia de grande distância, de grande atraso, de enorme rudeza associada a níveis de violência que diríamos incontroláveis, vivendo em lugares inóspitos, desertos sem horizonte, no interior de uma escassez eterna, cidades sujas, vivência indisciplinada e círculos sociais muito fechados. Talvez os oásis sejam o único elemento olhado com algum prazer. Certamente uma parte desta visão dita ocidental e civilizada corresponderá a padrões e quadro mental da sociedade árabe, em termos gerais. Por mim, preferi sempre olhá-los e compreendê-los através da grandeza do passado, desse tempo medieval em que impulsionaram a Europa para níveis culturais muito elevados. Tahar Ben Jelloun vem mostrar-nos neste livro que muitas das ideias que possuímos podem apenas corresponder ao visível e surpreende-nos quando fala dos jovens, do amor, das mulheres, dos sonhos e da sociedade árabe, neste caso, marroquina. Todo o livro foi lido com esse conforto que resulta do pressentimento do belo transportado nas palavras e sentimo-nos como passageiro dessas viagens que nos conduzem através da fantasia e do encanto até ao território onde moram os desejos que saem da imaginação que criamos quando procuramos o impossível. Ler O Escrivão Público é também um momento de ternura.

09 outubro, 2011

POESIA


Brancas e verdes

as ondas.

Azul e cinza

o céu.

Até no mar

a beleza

tem rosto de mulher.

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