Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

24 maio, 2008

LEITURAS

Creio que, se não estiver errado e se estiver me corrigirão, o Círculo de Leitores, o Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa, juntamente com a Temas e Debates que editou decidiram levar por diante um projecto denominado «Biografias dos Reis de Portugal».
Segundo os coordenadores científicos – Artur Teodoro de Matos e João Paulo Oliveira e Costa, este projecto “proporciona aos leitores uma viagem pelo tempo, onde estes poderão conhecer os homens e as mulheres que governaram o país ao longo de oito séculos, bem como as suas famílias, os amigos e inimigos, os jogos de poder, os projectos políticos e a acção governativa”. Dizem ainda que “cada livro proporciona também um quadro da época em que os monarcas viveram. Ao estudar as características da corte e os hábitos de cada soberano, os autores esboçam as vivências quotidianas que marcaram cada um dos monarcas portugueses, desde o século XII até aos alvores do século XX.”
Cada rei teve o seu historiador e D. Duarte teve a fortuna de lhe calhar em sorte o Prof. Luís Miguel Duarte. Num resumo demasiado estreito que consta do livro, diz-se apenas do autor que “nasceu em Viana do Castelo, licenciou-se em História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde tem feito a sua carreira académica. Investigador e docente de história medieval, as suas publicações incidem sobretudo em temas como a justiça e a criminalidade (área do seu doutoramento), a história urbana e a história militar. Tem também dedicado trabalhos à história do Porto.”
O Prof. Luís Miguel Duarte deu como título ao seu excelente trabalho da vida deste rei, filho do Mestre de Avis, “D. Duarte, Requiem por um rei triste”.
Diz-nos o Prof. Logo de início que “Quase todos os historiadores sonham escrever uma biografia. E, conversando entre si, discutem preferências. Eu desde que me lembro me senti fascinado pela figura deste rei breve e relativamente mal-amado. Por isso, quando fui convidado para o projecto e me foi proposto D. Duarte, aceitei com entusiasmo.”
Esse entusiasmo há-de ser visível ao longo das cerca de 370 páginas por onde estendeu a vida deste rei, culto, sensato a quem foi atribuída a responsabilidade de prolongar um reino saído de uma revolução extraordinária – a apreciação é minha – como foi a desse ano de 1383 iniciada quando corria o sexto dia do mês de Dezembro.
O Prof. Luís Miguel Duarte não construiu apenas uma obra, um exemplar trabalho de história, foi mais longe, muito mais do que um historiador costuma chegar, dialoga com o leitor, não só como se desse uma aula, explicando os factos, mas antes, levando-nos até junto dos lugares, do tempo, das dificuldades, dos dramas que teve de viver o rei. Faz-nos andar pela corte, pelas cortes, conduz-nos até Ceuta e ao desastre de Tânger. Mais que um diálogo sobre a história, é uma conversa de serão. Em redor da lareira, relata-nos um tempo de há 600 anos, faz-nos regredir no nosso quadro mental, solicita-nos a opinião, faz-nos intervir e quando chegamos ao fim, sentimo-nos, contentes e fatigados. Contentes por sabermos muito mais do que no início desse diálogo e fatigados, porque vivemos intensamente cerca de 40 anos da vida de um rei, da vida de um reino que certamente, não por coincidência, é esta pátria onde vivemos. Apaixonamo-nos? Sem dúvida, apesar de não esquecermos o alerta do Prof. quando nos dizia na introdução que “Parti consciente de uma derradeira armadilha: D. Duarte e eu passámos, nos últimos anos, demasiado tempo juntos. O rei tornou-se «muito lá de casa», e eu próprio reconheço que me comecei a permitir familiaridades porventura impróprias com o soberano. Geraram-se fortes empatias – do meu lado apenas, está bom de ver.”

Venho pois, no fim de tão deliciosa e educativa leitura, recomendar-vos este D. Duarte. Aproveitem a Feira do Livro que aí chega e privilegiem-no nas vossas escolhas e não se assustem com a espessura do volume, pois também para isso nos ajuda o Prof. Luís Miguel Duarte no final da sua introdução: “pelo sim pelo não, termino esta introdução com um conselho de D. Duarte em pessoa: «A uma hora [ou seja, de cada vez] nom leiais muito, mas boa parte menos do que puderdes, assi que se puderdes aturar ler doze folhas, nom leiais mais de três ou quatro»”.

Nascido em Viseu, em 1391, e falecido em Tomar, em 1438, passou sobretudo à história como co-responsável pelo desastre de Tânger e pelo cativeiro e morte do seu irmão D. Fernando. O cognome de Eloquente ganhou-o talvez por ter escrito o Leal Conselheiro, uma obra que hoje quase ninguém conhece. Não teve, nem de longe, uma reputação semelhante à dos seus irmãos D. Henrique e D. Pedro. Apesar de ter tido um reinado muito breve, cinco escassos anos, entre dois de quase meio século (o do pai, D. João I e o do filho, D. Afonso V), ele colaborou activamente no governo do reino desde a preparação da tomada de Ceuta (1415) até à morte do pai, em 1433. por isso se falou dele como «um infante que nunca mais chegava rei». Talvez prejudicado pelo excesso de protagonismo dos vários irmãos, obcecado pelo sentido dever e pelo comportamento virtuoso, sofreu uma depressão que, em páginas raras, nos descreve na primeira pessoa. Oliveira Martins traça dele uma imagem fortemente negativa: seria o exemplo do homem bom que só por equívoco chegou ao trono.
A realidade é bem mais complexa e interessante. Caçador, lutador, soldado quando foi preciso, escreveu duas obras e aplicou-se para além das suas forças no governo do reino. Do seu casamento – demorado a negociar e em relação ao qual ainda subsistem várias dúvidas – com D. Leonor dita «de Aragão» nasceram, em dez anos, nove filhos. Morreu de peste, aos 47 anos, atormentado com o dilema entre a devolução de Ceuta aos muçulmanos e a libertação de D. Fernando, preso em fez. Deixou um reino dividido entre o partido da rainha viúva e o do infante D. Pedro, seu irmão.

Obra distinguida com uma menção honrosa do júri do prémio A. De Almeida Fernandes, atribuído pela Fundação Mariana Seixas, de Viseu, para os melhores trabalhos sobre história medieval portuguesa.

da contracapa

04 maio, 2008

POESIA AO AMANHECER


Bom dia, meus Amigos

Hoje vinha contar-vos uma viagem que fiz, mas perdi o fulgor porque esta noite voltei a não dormir e sinto-me imensamente cansado. Queria deitar-me ao sol, fechar os olhos e dormir e..., não posso, não posso deixar que a viagem prossiga sem mim. É verdade, ontem viajei pelo Alto Minho. Todos vivemos essa tragédia, farsa, amor ou amizade, encontro a dois, seja o que for, de fazer anos de casado e por isso fui almoçar fora e percorrer caminhos longínquos como por exemplo Paredes de Coura, esse Portugal absolutamente desconhecido entre vales e desfiladeiros, serranias e aldeias recônditas onde ninguém vai. Os campos todos recortados, parcelados nessa propriedade dita de minifúndio e o verde, sempre o verde, imensos tons de verde. Aconselho-vos essa viagem, mas primeiro casem-se. É difícil, mas é a única maneira de comemorarem. Ninguém comemora sem fazer a festa primeiro e depois vão pelo mundo fora à procura da beleza das coisas e das gentes.

SE EU FOSSE APENAS...

Se eu fosse apenas uma rosa,
Com que prazer me desfolhava,
já que a vida é tão dolorosa
e não te sei dizer mais nada!

Se eu fosse apenas água ou vento,
com que prazer me desfaria,
como eu teu próprio pensamento
vais desfazendo a minha vida!

Perdoa-me causar-te a mágoa
desta humana, amarga demora!
- de ser menos breve do que a água,
mais durável que o vento e a rosa...

CECÍLIA MEIRELES

"- Vocês não são nada parecidas com a minha rosa! Vocês ainda não são nada - disse-lhe ele. - Não há ninguém preso a vocês e vocês não estão presas a ninguém. Vocês são como a minha raposa era. Era uma raposa perfeitamente igual a outras cem mil raposas. Mas eu tornei-a minha amiga e, agora, ela é única no mundo."

ANTOINE SAINT-EXUPÉRY, in "O Principezinho"

"O carácter de pedra de toque da justiça criminal, do seu papel eminentemente simbólico nas sociedades e no relacionamento destas com o Estado resulta ainda de um outro factor. É que justiça criminal afirma uma reclamação radical do Estado de poder restringir direitos fundamentais dos cidadãos, designadamente a sua liberdade. Num tipo de contrato social, como o do nosso país, em que o pressuposto da organização da sociedade é que esta é composta de cidadãos livres e iguais em direitos, o exercício de um poder com aquele conteúdo, por parte do Estado, implica necessariamente que ele estará sempre num dos centros da atenção de toda a vida democrática."

PENA DOS REIS, "Justiça criminal e a crise", in "Ideias à Esquerda"

Porto, 03 de Maio de 2004

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