Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

26 outubro, 2011

POESIA AO AMANHECER



Bom dia, meus Amigos

Regressei a estes silêncios matinais. Por agora não vejo o brilho do azul do céu, com aquela luminosidade que nos faz lembrar os campos do sul. Está cinzento, mas calmo, apaziguador mesmo, e os tons de verde das copas das árvores, daqui só lhes vejo o cimo, dão uma certa monotonia a esta paisagem urbana que paira sobre o ruído, a confusão e a pressa de quem caminha sem ter tempo de olhar à sua volta. Por aqui vou tratando os sinistros. Sim, os acidentes de automóvel para os quais tive sempre um fascínio atractivo como se possuíssem um imã magnético. Na averiguação e análise, seduzem-me os comportamentos, o quadro mental que os intervenientes vivem, mas sobretudo aqueles que acabam por desenhar a bel-prazer das suas necessidades. Chega a ser espantosa a sua capacidade de mentir, de adulterar os factos. De tal forma que há um momento que já só acreditam no acidente que recriaram e duvidam daquele que aconteceu. Atrevo-me a dizer que os portugueses têm uma compulsão para a mentira. Não vou dizer como alguns diziam há dias que não aprendemos matemática por razões genéticas. Não, não vou porque a burrice só é genética quando a cultivamos como um paradigma ao longo dos tempos. Vou antes dizer que nos acidentes de viação, mentir, para além de nos ser útil, é quase um conforto, uma forma de termos uma segunda intervenção de continuarmos actores de uma peça que desejamos original. E como eles tão bem mentem, mesmo quando os olhamos nos olhos e eles vêem que já percebemos que estão a mentir. É esse o momento em que desfraldam a vela, sopram o vento e seguem em frente à bolina realçando as suas virtudes morais e éticas com aquele argumento eloquente e devastador de que “eu quando tenho um acidente assumo sempre as minhas responsabilidades por muito que isso me custe”. É este o instante em que sentimos que a magia alcança o rubro e nos desarma em absoluto. Rendemo-nos perante tanto encanto. Portugueses! São assim os meus compatriotas e mais espantoso é que no meio desta palermice chegam a ser sedutores. Ditosa pátria que tais filhos tem, escreveu o Camões com aquela pena que conhecemos.

KASSANDRA

Homens, barcos, batalhas e poentes,
Não sei quem, não sei onde, delirava.
E o futuro vermelho transbordava
Através das pupilas transparentes.

Ó dia de oiro sobre as coisas quentes,
Os rostos tinham almas que mudavam,
E as aves estrangeiras trespassavam
As minhas mãos abertas e presentes.

Houve instantes de força e de verdade -
Era o cantar de um deus que me embalava
Enchendo o céu de sol e de saudade.

Mas não deteve a lei que me levava,
Perdida sem saber se caminhava
Entre os deuses ou entre a humanidade.

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in “Cem Poemas de Sophia”

Dizia a mim próprio, com revolta, que a natureza é injusta para com aqueles que obedecem às suas leis mais claras, visto que cada nascimento põe duas vidas em perigo. Cada um de nós faz sofrer, quando nasce, e sofre quando morre. Mas não tem importância que a vida seja atroz; o pior é ela ser inútil e sem beleza.

MARGUERITE YOURCENAR, in “Alexis ou o Tratado do Vão Combate”

“Em nome da luta contra a imigração clandestina, a 12 de Maio o governo francês reforçou as disposições repressivas contra os imigrantes – e não contra os que se servem deles. Para este fim, criou um Gabinete Central de Luta Contra o Trabalho Clandestino, ligado ao Ministério do Interior. No entanto, tal como é demonstrado por um relatório oficial mantido em segredo, o próprio Estado dá cobertura a redes legais.”

PATRICK HERMAN “Tráficos de mão-de-obra cobertos pelo Estado ”, in “Le Monde diplomatique”, Julho de 2005

Porto, 11 de Agosto de 2005

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