Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

13 maio, 2007

LEITURAS


No momento em que iniciava a leitura do livro A Fé em Guerra, mão amiga fez-me oferta de um outro livro sobre os muçulmanos, os árabes e a sua religião.
Esta obra, de Domingos Lopes e Luís de Sá tem a vantagem de ter sido publicada em 1997, ou seja quatro anos antes desse 11 de Setembro que tanto tem marcado as nossas vidas e condicionado as nossas sociedades, relembrando ao nosso esquecimento que a questão árabe juntamente com a sua religiosidade, não é recente. Tem pois, a vantagem de nos mostrar uma realidade não condicionada pelos interesses maléficos dos Estados Unidos e os seus aliados, quer dizer, os interesses do grande capital económico e financeiro que hoje damos em chamar de globalização.
Sob o título com Alá ou com Satã procuram os autores ir ao cerne da questão que faz mover os islamitas, daí deixarem a dúvida se aqueles agem em nome de Deus ou do Diabo. Para além de uma análise das transformações recentes do mundo em termos políticos e de interesses económicos, abordam a temática social e histórica, terminando com um conjunto de elementos sobre cada um dos países completando um quadro onde é possível palmilhar um caminho de percepção que nos mostra um espaço que só pode ser entendido na complexidade de cada momento da história que, diga-se, não teve os mesmos condicionalismos.
É verdade que desde o século VIII, a Europa atormenta-se com a proximidade árabe, mas não poderão estes, dizer o mesmo da Europa? O atraso daqueles não será uma consequência da ocupação europeia dos seus espaços territoriais, da exploração das suas riquezas e do suporte que é dado a regimes autocráticos, conservadores e muitos deles possuidores de um fundamentalismo, o qual, em nome de um fervor religioso alimenta uma casta de senhores? Se nos podemos interrogar se o fundamentalismo das massas árabes serve Deus ou o Diabo, não seria mais correcto dirigirmos a pergunta para os palácios onde ainda prevalecem as sombras da noite, e fazê-la no sentido inverso, quer dizer, não estarão os senhores do petróleo, em nome de Deus a servir o Diabo sendo este o que governa os seus interesses espúrios? Sobre os territórios árabes, floresceram civilizações extraordinárias ao longo de milénios. Egípcios, Persas, Hititas, só para mencionar três a título de exemplo, deixaram marcas indeléveis no caminho da humanidade. Por onde andava a Europa no auge da civilização egípcia? Onde surgiram os primeiros núcleos urbanos? Que povo foi esse que permaneceu seis séculos no ocidente europeu, deixando presença assinalável no âmbito da cultura, do conhecimento, do património e de tantos outros aspectos que compõem a vida humana? É verdade que o domínio otomano pareceu retirar brilho à caminhada destes povos pelos afluentes da vida, mas tê-lo-ão feito mais do que a ocupação colonial, inglesa, francesa e italiana? Neste capítulo, os autores deixaram-me grandes dúvidas quando afirmam que o obscurantismo da presença otomana explica em parte o desprezo pela democracia dos regimes árabes. Não é essa a minha convicção. O desprezo pela democracia já foi diversas vezes demonstrado na Europa e noutros países em que os europeus têm grande e decisiva influência e, no entanto, tal aspecto não foi impeditivo de uma vida democrática posterior. Por outro lado, em termos de obscurantismo que pode dizer a Europa dos seus séculos XV a XVIII? E no entanto, a democracia não sobressai hoje nos seus diversos territórios? A democracia tem o seu tempo histórico e ocorre com o ascenso e o domínio político da burguesia enquanto em muitas sociedades árabes e muçulmanas vivemos ainda um tempo que é medieval, em termos de valores, de cultura e de interesses. Não será por acaso que o sagrado prevalece sobre o profano que a religião e a presença de Deus acordam a população e seguem-na até ao repouso e sendo o mundo tão dependente de Deus é lógico e compreensível que as massas humanas lhe dediquem e ofereçam o que de melhor ou mais valioso têm de si próprios, a vida.
Continuo a olhar para os árabes, talvez mais para os árabes de que para os muçulmanos de forma a tentar compreender como se move toda aquela manta cultural, tentar perceber a diferença entre o palácio e a rua entre as cúpulas douradas das mesquitas e as agruras da vida. São multidões de seres humanos desprezados e humilhados e que é necessário manter sub um jugo perpétuo para que o petróleo possa jorrar nas rotas certas, nem que para isso se utilize a força na crença de um Deus que é tudo e quando a semente da revolta, certa ou errada, lhes escapa ao controlo, então parece que servem o Diabo.
Para mim, o canto árabe, essa poesia que nasce nos desertos de África ou da Arábia, é ainda um valor universal que me cativa, daí que continue a aceitar que quando agem no que parecem ser acções contra o mundo, estão servindo o seu Deus, embora pareça que o façam em nome do Diabo, mas para eles, certamente, o Diabo é antes de mais aqueles que os vão condenando à miséria extrema apesar de dormirem sob fortunas colossais.
É mais uma leitura recomendável para nos ajudar a percepcionar essa realidade que perturba os donos do mundo.

Free Web Counter
Site Counter