Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

05 abril, 2007

LEITURAS


A última das leituras vagarosas que faço teve como tema, o Islão, o islamismo e o fundamentalismo islamita. O livro, “A Fé em Guerra”, foi-me recomendado no início de Janeiro e li-o com prazer e a sensação da descoberta. O autor, Yaroslav Trofimov, deixou a Ucrânia aos 15 anos e acabou por casar com uma judia que havia deixado Tripoli. Vivem em Roma e em 1999 tornou-se correspondente do Wall Street Journal. Desde 2001 percorreu diversos países onde predomina a religião muçulmana, desde o Mali ao Afeganistão, passando pelo Iémen, o Iraque, o Líbano, a Arábia Saudita, entre outros países. Procurou em cada um dos locais que visitou, contactar e conhecer os diversos aspectos da vida quotidiana e o que move o homem simples como é vulgo dizer-se, o homem da rua, quais os seus sentimentos para com a religião, para com a tradição e a fé, para com os valores exteriores, para com a vida, tal como a sentimos no que chamamos Ocidente. É interessante seguir o percurso feito pelo jornalista, realçando, pelo facto de me tocar de forma particular, embora também tenha a ver com o momento actual, as visitas ao Líbano, ao Iraque e ao Afeganistão. A visita ao Líbano e ao Hezbollah dois anos antes dessa extraordinária guerra de resistência protagonizada por esta organização, ajuda-nos a compreender melhor o presente. É certo que o jornalistas deixa, aqui e ali, vir ao de cima alguns dos tiques europeus quando não queremos compreender porque razão o resto do mundo não comunga das nossas opiniões, mas no essencial e no conjunto das suas reportagens, deixa-nos a ideia de que estamos perante uma pessoa séria que tenta entender o que o rodeia e procura transmitir para os que o lêem o máximo de rigor na realidade que o observa. O acompanhar dos primeiros dias e semanas da guerra contra o Iraque é bem elucidativo do que está a acontecer hoje, mas no Afeganistão tive uma grata surpresa. Para além de nos trazer uma visão bem viva do que está suceder, não deixa de relatar o diálogo com o guia que o acompanha e do que este pensava da presença do Exército Vermelho e do regime do PPD afegão que então estava no poder. É que esses quinze anos em que o Afeganistão progrediu se tornou uma sociedade laica e instruída e de grande liberdade para os homens e mulheres desse martirizado país, principalmente das grandes cidades, nomeadamente Cabul, têm sido cuidadosamente silenciados, eliminados das páginas dos analistas e de toda essa gente séria de fato e gravata que nos invade diariamente a mente para nos incutir verdades absolutas. A prova de que esse regime tinha o apoio popular, é que o regime do PPD sobreviveu durante três anos após a retirada das tropas soviéticas e só o apoio maciço desse país da democracia que são os EUA aos, agora terroristas, talibans e a todas as outras seitas de senhores da guerra que hoje se encontram sentados em Cabul, em Kandaar ou em Herat, nas cadeiras do poder.
Tenho observado o Islão ao longo dos anos e não comungo dessa visão Ocidental de que daquele lado estão os maus e do lado desta democracia, os bons, os inocentes, os pobres coitados, os salvadores morais do mundo. Se pensarmos no mundo árabe o que encontramos são países saídos há décadas do colonialismo e que ainda não tiveram oportunidade de criar vivências sólidas e estáveis e que não conseguiram conciliar, a não ser através de violenta repressão, o saque praticado por alguns grupos minoritários sentados no poder e a miséria, as dificuldades e as aspirações de milhões de deserdados que abundam nessas sociedades. É esse desespero que ajuda os fundamentalistas a aproximarem-se do poder, mas entre estes e alguns governos autocráticos, venha o diabo e escolha. Mas têm sido essas massas anónimas e cansadas de esperar que se erguem contra os poderes constituídos, Essa falta de esperança aliada a um certo fanatismo religioso, a um extremismo no interpretar a fé, geram um rastilho de fogo que teve na Argélia uma espiral de dor e no Iraque uma girândola de violência que a alma dos homens já não consegue suportar.
Ainda transporto na memória essa construção de tolerância que tenho encontrado na sociedade árabe desde os tempos medievais se a compararmos com a violência da época e a das outras sociedades religiosas, ideia essa que prolonguei pelo Império Otomano. Só assim se compreende que ao longo de séculos ali se tenham acolhido grandes comunidades judias, as quais só a intolerância do actual Estado de Israel conseguiu expulsar.
Foi, portanto, uma agradável leitura e, recomenda-se.

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