Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

15 maio, 2010

POESIA AO AMANHECER


Bom dia, meus Amigos

Escrevia-vos no amanhecer de ontem sobre a partida do General, quando não, cai-me a notícia da partida do Político e do Poeta. Quis o destino que se juntassem todos na hora do adeus e embora possa parecer paradoxal, os três simbolizam o que sempre persegui e o caminho que ainda terei de percorrer. Do General já vos disse o que pensava, como o via e os momentos que me traz à memória. Nunca estive na sua presença, excepto uma vez em que me aproximei a uns 50 mts., aspecto sem valor para se conhecer o Homem. Conheci-o antes pelas ideias e pela sua prática. O Político houve um tempo em que o encontrei diversas vezes, mas na memória ficará sempre a primeira há 32 anos na longínqua capital da Rússia soviética quando se sentou do outro lado da mesa numa sala da Escola onde vivia e nos quinze minutos que se seguiram, falamos do meu futuro que oito meses depois esse mar que nasceu em Santarém e desaguou no Terreiro do Paço, alterou. O Político tinha então 60 anos e eu estava nos meus vinte e um. Foi uma conversa calma, serena e aquele Homem que se sentava na minha frente, acabado de ser condecorado pelo governo soviético, quase não revelava essa passagem extraordinária pela história, com 30 anos de clandestinidade, dezasseis de prisão e uma fuga espantosa. Aquela personagem, com uma capacidade intelectual quase inigualável, falava então naquele Outono longínquo do que gostaria eu de fazer, politicamente, entenda-se, e como poderia ser mais útil no meu regresso ao país. Certamente terá sido algumas vezes duro nas decisões, intransigente nos princípios, inflexível no caminho. Mas imagina-se outra forma de liderar um Partido que caminha por entre escolhos tão grandes? Creio que não, tanto, mais que por trás dessa máscara de liderança, estava uma pessoa sensível, capaz de escutar e colocar o sentimento humano como uma necessidade a satisfazer. A sua vida, a forma como a viveu, ajudou-me a pensar, a reflectir e a tornar o sonho mais verdadeiro. O Poeta conheci-o um pouco antes. Vivia em frente à casa onde então habitava e descobri-o quando tentávamos encantar o olhar moreno da empregada. Durante muito tempo, perdi-lhe o rumo e quando o voltei a encontrar foi através das palavras que escreveu, algumas das quais guardo na memória, como pensamentos permanentes. “Foi o sorriso, creio que foi o sorriso que me abriu a porta…”. Um dia, quando chorava amores perdidos entre os cedros que rodeiam o cemitério de Padronelo, li-o de fio a pavio, já não distinguindo as lágrimas dos amores, daquelas que a poesia fazia nascer. Agora, o destino leva-os a todos de uma só vez. Deixaram, contudo, obra estampada nas ideias, nos sonhos, nas palavras e hoje quando os vejo prestes a deixar-nos sinto a alma marejada de lágrimas, não daquelas que nos saltam dos olhos, mas das outras, das que enchem rios de sonhos que murmuram e desabrocham em galope para um mar de esperança. Procurei sempre que a minha vida fosse assim com essa simbiose de vontades. A acção política baseada na coerência e na pureza dos actos, com a determinação e a coragem de um soldado, mas sempre com a alma inundada de poesia. Não o vou conseguir, mas já vos disse que sou um perseguidor de ideais. Não sei ainda onde vai aportar um dia esta armada de velas desfraldadas, mas seja onde for, será certamente num mundo novo. Para este momento de aceno, de erguer de cravos e de rosas, de flores que perfumam o céu, deixo-vos com as palavras de quem as merece. Qual o primeiro, qual o último? Queria que fosse o poeta, pois a poesia é fruto que não apodrece, mas começo com o General, pois também desejo que haja poesia na disciplina e na regra. “Amado por uns… odiado por outros… Como poderão gostar de mim os grandes senhores do dinheiro, os homens dos grupos económicos e suas clientelas, os latifundiários,“. Ao Poeta, deixo as palavras que trago na alma. “É um silêncio sem ti / Sem álamos, sem luas / Só nas minhas mãos ouço a música das tuas”. E do Político, recordo apenas e simplesmente um “Até Amanhã Camaradas”.

TROVA DA PLANÍCIE

Quando os cutelos de sombra
Acordaram a Planície
Se te vierem dizer
Que eu te disse
Que aquela flor lanceolada
não resiste
Como uma estrela fechada
Como uma noiva deitada
À espera da madrugada
Mais verdadeira que existe

Se te vierem dizer
Não olhes a Cassiopeia
Mas deita-te meu amor
Na ponta de cada veia
E encosta o teu rosto molhado
Ao rosto frio da areia
Porque a areia não engana
Quando vem a maré cheia.

ORLANDO DE CARVALHO, in “O Nosso Amargo Cancioneiro”

A riqueza parecia instalada, naquela casa, desde tempos muito antigos, como em nossa casa a pobreza. Os príncipes de Mainau sempre tinham sido ricos; não podíamos pois admirar-nos que ainda o fossem, e nem sequer os pobres se irritavam com isso.

MARGUERITE YOURCENAR, in “Alexis ou o Tratado do Vão Combate”

“Riquezas sem conto, palácios fabulosos, intrigas que não respeitam, nem pais nem irmãos… A Índia mongol aparece como um mundo de lenda”.

ÓSCAR PUJOL, “Os construtores do Taj-Mahal. A Índia Mongol”, in “Historia national geographic”, nº11

Porto, 14 de Junho de 2005

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