POESIA AO AMANHECER
Bom dia meus Amigos,
Hoje venho contar-vos uma história, melhor um filme. É verdade, ontem saí às 16h00 e fui ao cinema. Como à hora que eu pretendia só havia um filme, foi fácil a escolha: Could Montain com a Nicole Kidman. O resto dos nomes, como depreendem não me recordo. Vou falar do filme através de três momentos: a guerra, a natureza e o amor.
A guerra está sempre presente, desde o início até ao fim com imagens terríveis e até dramáticas. A guerra faz-me lembrar uma noite de Moscovo de há trinta anos atrás. Da Bolívia recordo sempre os Andes. Essa imensidão de montanhas, de gelo, de desfiladeiros na mais profunda das solidões. Por ali podemos caminhar uma vida inteira sem encontrar ninguém. É um pouco como na música do Simon and Garfunkel, El Condor Pasa. Ali floresceram os Incas até serem dizimados por esse herói nacional de Espanha que dá pelo nome de Pizarro. Sobre La Paz, em pleno altiplano, habitam os mineiros e a gente pobre. Pobre na Bolívia é sinónimo de miséria absoluta. Liliana era uma índia boliviana que naquela noite de neve me contava quando nos tempos da ditadura de 72, isto admitindo que a Bolívia alguma vez viveu sem ser em ditadura, os mineiros desceram às ruas da capital e enfrentaram os carros de combate de mãos vazias e o coração cheio de coragem. Deitaram-se no chão para lhes deterem a marcha e os tanques avançaram sempre. Esta imagem faz-me lembrar a guerra, essas batalhas infindáveis que têm acompanhado o Homem nessa caminhada pela história num misto de grandiosidade e de violência. Eu combati sem ir à guerra e nunca concebi no pensamento essa ideia de matar. Quantas vezes imagino, a bestialidade da guerra a quebrar num ápice anos e anos de sonhos. Aqui vem ao de cima tudo o que temos de mau e de bom e o sentimento de impunidade gera por vezes baterias de violência sem fim. Desejo poucas coisas da vida, um livro para ler, o mar para olhar, as montanhas para caminhar, um emprego para trabalhar, uma casa para habitar, amigos para conversar e uma mulher para amar. Coisas simples como vêem e no entanto tão difíceis de alcançar obrigando-nos a um combate quotidiano para que algumas possam ser realidade. Pois é, mas sem gostar da guerra tenho de admitir que dou voz àquelas palavras do poeta quando escreveu, “já vi homens que morriam por qualquer coisa que amavam”. É verdade, até ao fim da vida, continuarei a estar disponível para morrer por uma coisa dessas, um ideal, uma causa, valores e símbolos e como tudo isto está tão barato no mercado da guerra. Afinal, um Homem tem de possuir qualquer coisa em que acreditar.
A natureza. Vocês sabem que não gosto dos Estados Unidos. Mas na sua imensidão de costa a costa está aquele território povoado de montanhas, florestas, rios e neves eternas e a natureza naquele estado quase selvagem é sempre uma sedução. Se pudesse viajava todos os dias às montanhas. É uma pena que entre a minha casa e a AXA não se situe uma montanha em estado puro para poder vir a pé para o trabalho. Aparecem imagens bonitas daquela natureza, daquele antigo território dos cherokees.
Por último, o amor. Talvez tenha sido na solidão da adolescência que aprendi a amar, a vida e os seres humanos naquilo que têm de mais belo e mais nobre. Não seria sincero se não dissesse que dos seres humanos destaco as mulheres nesses amores, o que é natural. Mas foram sempre amores longínquos, porque a proximidade perturba, rotina e faz perder o sentido da paixão. No filme, o amor é também vivido ao longe, de recordações, de pensamentos, dos últimos gestos, dos últimos momentos e quando assim é prolongamo-lo quase eternamente, não esgotamos os sentimentos nem o sentido da beleza. Dos que partem ou ainda não chegaram, guardamos sempre o melhor e se alguma vez chegam ou regressam acabam até por embaciar a imagem que tão meticulosamente criamos. Por isso digo que o melhor é amar ao longe. Somos sempre incentivados a procurar o que não temos e os nossos dotes de sedução apuram-se na tentativa de alcançar o que desejamos. Vem ao de cima, o melhor que temos de nós próprios. No filme, eles reencontram-se, mas ele morre pouco após terem-se amado, pelo que voltou a ficar o melhor na recordação que deixou. Por mim vou continuar a perseguir amores impossíveis. Quiçá um dia, talvez um deles possa vir a gostar de mim e como dizia uma antiga Directora de Recursos Humanos, todos necessitamos que gostem de nós.
Foi assim que vi o filme.
Bom fim-de-semana para todos vós.
ATLANTES
Fechados no castelo
ao fim da tarde
amantes secretos de outras vidas
recordavam
milénios devolvidos
esse espaço de brumas esquecidas
Outros ritos se lavraram
outras coisas
que o gesto não tem sempre a mesma dança
e o vento varre os montes
devagar
e às vezes bem mais do que alcançar
o gozo é
preparar o que se alcança
Como um passe de magia e elegância
a vontade vai crescendo
e cava fundo
e o baile das loucuras começou
enquanto a porta pesada afasta o mundo
Celebro nesse corpo o mar da vida
entregue a rituais
no meio dos montes
o prazer
ao fim de tudo
é a distância renascida
o prazer ao fim de tudo
é mais do que a corrida
É a distância
mais longa
entre dois pontos
PEDRO BARROSO, in "Das Mulheres e do Mundo"
"Mas, à medida que a estrela se contrai, a força de gravidade aumenta rapidamente e, quando o diâmetro da estrela já diminuiu para 6 quilómetros, a gravidade à sua superfície é milhares de milhões de vezes mais forte do que a força de gravidade à superfície do Sol. A potência desta força enorme impede os raios de luz de abandonarem a superfície da estrela: tal como a bola lançada para o ar, eles são atraídos no sentido contrário e não podem libertar-se para o Espaço. A partir deste momento a estrela é invisível. É um buraco negro no espaço."
ROBERT JASTROW, in "A Arquitectura do Universo"
"Na nova economia, em rota para uma sociedade que se auto-represente como sendo do conhecimento, o tempo tende a tornar-se simultaneamente num recurso cada vez mais escasso e mais fundamental."
ALFREDA CRUZ e HELENA RATO, in "Manifesto", Dezembro de 2003
Porto, 19 de Março de 2004
Hoje venho contar-vos uma história, melhor um filme. É verdade, ontem saí às 16h00 e fui ao cinema. Como à hora que eu pretendia só havia um filme, foi fácil a escolha: Could Montain com a Nicole Kidman. O resto dos nomes, como depreendem não me recordo. Vou falar do filme através de três momentos: a guerra, a natureza e o amor.
A guerra está sempre presente, desde o início até ao fim com imagens terríveis e até dramáticas. A guerra faz-me lembrar uma noite de Moscovo de há trinta anos atrás. Da Bolívia recordo sempre os Andes. Essa imensidão de montanhas, de gelo, de desfiladeiros na mais profunda das solidões. Por ali podemos caminhar uma vida inteira sem encontrar ninguém. É um pouco como na música do Simon and Garfunkel, El Condor Pasa. Ali floresceram os Incas até serem dizimados por esse herói nacional de Espanha que dá pelo nome de Pizarro. Sobre La Paz, em pleno altiplano, habitam os mineiros e a gente pobre. Pobre na Bolívia é sinónimo de miséria absoluta. Liliana era uma índia boliviana que naquela noite de neve me contava quando nos tempos da ditadura de 72, isto admitindo que a Bolívia alguma vez viveu sem ser em ditadura, os mineiros desceram às ruas da capital e enfrentaram os carros de combate de mãos vazias e o coração cheio de coragem. Deitaram-se no chão para lhes deterem a marcha e os tanques avançaram sempre. Esta imagem faz-me lembrar a guerra, essas batalhas infindáveis que têm acompanhado o Homem nessa caminhada pela história num misto de grandiosidade e de violência. Eu combati sem ir à guerra e nunca concebi no pensamento essa ideia de matar. Quantas vezes imagino, a bestialidade da guerra a quebrar num ápice anos e anos de sonhos. Aqui vem ao de cima tudo o que temos de mau e de bom e o sentimento de impunidade gera por vezes baterias de violência sem fim. Desejo poucas coisas da vida, um livro para ler, o mar para olhar, as montanhas para caminhar, um emprego para trabalhar, uma casa para habitar, amigos para conversar e uma mulher para amar. Coisas simples como vêem e no entanto tão difíceis de alcançar obrigando-nos a um combate quotidiano para que algumas possam ser realidade. Pois é, mas sem gostar da guerra tenho de admitir que dou voz àquelas palavras do poeta quando escreveu, “já vi homens que morriam por qualquer coisa que amavam”. É verdade, até ao fim da vida, continuarei a estar disponível para morrer por uma coisa dessas, um ideal, uma causa, valores e símbolos e como tudo isto está tão barato no mercado da guerra. Afinal, um Homem tem de possuir qualquer coisa em que acreditar.
A natureza. Vocês sabem que não gosto dos Estados Unidos. Mas na sua imensidão de costa a costa está aquele território povoado de montanhas, florestas, rios e neves eternas e a natureza naquele estado quase selvagem é sempre uma sedução. Se pudesse viajava todos os dias às montanhas. É uma pena que entre a minha casa e a AXA não se situe uma montanha em estado puro para poder vir a pé para o trabalho. Aparecem imagens bonitas daquela natureza, daquele antigo território dos cherokees.
Por último, o amor. Talvez tenha sido na solidão da adolescência que aprendi a amar, a vida e os seres humanos naquilo que têm de mais belo e mais nobre. Não seria sincero se não dissesse que dos seres humanos destaco as mulheres nesses amores, o que é natural. Mas foram sempre amores longínquos, porque a proximidade perturba, rotina e faz perder o sentido da paixão. No filme, o amor é também vivido ao longe, de recordações, de pensamentos, dos últimos gestos, dos últimos momentos e quando assim é prolongamo-lo quase eternamente, não esgotamos os sentimentos nem o sentido da beleza. Dos que partem ou ainda não chegaram, guardamos sempre o melhor e se alguma vez chegam ou regressam acabam até por embaciar a imagem que tão meticulosamente criamos. Por isso digo que o melhor é amar ao longe. Somos sempre incentivados a procurar o que não temos e os nossos dotes de sedução apuram-se na tentativa de alcançar o que desejamos. Vem ao de cima, o melhor que temos de nós próprios. No filme, eles reencontram-se, mas ele morre pouco após terem-se amado, pelo que voltou a ficar o melhor na recordação que deixou. Por mim vou continuar a perseguir amores impossíveis. Quiçá um dia, talvez um deles possa vir a gostar de mim e como dizia uma antiga Directora de Recursos Humanos, todos necessitamos que gostem de nós.
Foi assim que vi o filme.
Bom fim-de-semana para todos vós.
ATLANTES
Fechados no castelo
ao fim da tarde
amantes secretos de outras vidas
recordavam
milénios devolvidos
esse espaço de brumas esquecidas
Outros ritos se lavraram
outras coisas
que o gesto não tem sempre a mesma dança
e o vento varre os montes
devagar
e às vezes bem mais do que alcançar
o gozo é
preparar o que se alcança
Como um passe de magia e elegância
a vontade vai crescendo
e cava fundo
e o baile das loucuras começou
enquanto a porta pesada afasta o mundo
Celebro nesse corpo o mar da vida
entregue a rituais
no meio dos montes
o prazer
ao fim de tudo
é a distância renascida
o prazer ao fim de tudo
é mais do que a corrida
É a distância
mais longa
entre dois pontos
PEDRO BARROSO, in "Das Mulheres e do Mundo"
"Mas, à medida que a estrela se contrai, a força de gravidade aumenta rapidamente e, quando o diâmetro da estrela já diminuiu para 6 quilómetros, a gravidade à sua superfície é milhares de milhões de vezes mais forte do que a força de gravidade à superfície do Sol. A potência desta força enorme impede os raios de luz de abandonarem a superfície da estrela: tal como a bola lançada para o ar, eles são atraídos no sentido contrário e não podem libertar-se para o Espaço. A partir deste momento a estrela é invisível. É um buraco negro no espaço."
ROBERT JASTROW, in "A Arquitectura do Universo"
"Na nova economia, em rota para uma sociedade que se auto-represente como sendo do conhecimento, o tempo tende a tornar-se simultaneamente num recurso cada vez mais escasso e mais fundamental."
ALFREDA CRUZ e HELENA RATO, in "Manifesto", Dezembro de 2003
Porto, 19 de Março de 2004
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