Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

10 setembro, 2010

POESIA AO AMANHECER


Bom dia, meus Amigos

Não sei se já vos falei que um dia vi o maior camião do mundo. É verdade e lembrei-me disso no período de férias quando precisei de areia e de uns sacos de cimento e pedi à drogaria lá do bairro para me levar este material a casa. Às 8 horas da manhã lá apareceram e quando olhei a camioneta lembrei-me daquele camião enorme. Ontem quando acabei de vos contar a minha história com o Freitas estava a caminho do Porto. Passado uns dias, fui para a Figueira da Foz e três meses depois regressei a Viana para trabalhar na construção da Portucel, pois, entretanto tinha perdido o outro emprego. Nesse tempo havia em Viana muitos trabalhadores de fora, pelo que não faltava quem alugasse quartos. Vivia num com três camas e, normalmente, quando uns chegavam, outros saíam pois trabalhava-se por turnos. Ao fim de semana, era o único que ficava por lá e ao Domingo de manhã encontrava as três filhas da dona da casa, as quais eram todas tão bonitas que nunca cheguei a eleger nenhuma. Acho que ainda hoje estou a tentar escolher. A beleza tem destas coisas. As manhãs de trabalho eram muito longas. Principiavam às oito e terminavam à uma da tarde. Sabia quando estávamos a meio pelo facto de às dez horas e dez minutos passar a automotora de Vigo para o Porto. Não vos vou dizer que era duro. Era duro, mesmo. Da quantidade de jovens que ali trabalhavam, eu era o mais velho. Os restantes tinham entre 15 e 18 anos. Naquela 5ª Feira, contudo, tudo ia ser diferente. Lembro-me do dia da semana, pois era o dia em que comia arroz de lampreia no pequeno restaurante junto ao estaleiro. Custava naquela época uma refeição destas, 23$00. Então como estava a dizer, tudo foi diferente, dado que por volta das nove horas chegou o maior camião do mundo. Nós vimos que era grande, mas só depois, percebemos que era mesmo o maior. Era um veículo articulado carregado de sacos de cimento. Agora pesam 40 kg que a UE mandou, mas na época, tinham mesmo 50 kg de cimento e não vinham em paletes como hoje onde as pás das máquinas entram e transportam até os encastelar no chão. Não. O nosso trabalho era simples. Aproximávamo-nos da caixa de carga com as costas voltadas para esta, encostavam-nos um daqueles sacos e só tínhamos que inclinar as costas e levá-los assim cerca de 20 mts. Este gesto foi-se repetindo pelo resto da manhã, só que com as horas a passar os sacos foram aumentando de peso e o camião foi crescendo de comprimento de forma que nunca mais acabava a descarga. A certa altura, metade daqueles jovens já não voltava, sendo necessário procurá-los e pela minha parte lá ia e vinha conforme podia. Creio que o último já devia pesar 100 kg e a traseira do camião atravessava a linha do comboio. Acabou à hora do almoço e a seguir à lampreia, deitei-me num daqueles pequenos barcos que estavam na margem do rio. Deitei-me, quer dizer, adormeci de tal forma que só acordei com o trepidar do motor da máquina de arrasto. Agora ao chegar o pequeno camião da drogaria até me assustei, pois tive medo que fosse outro do tamanho do anterior, mas não, este era bem mais pequeno e tudo durou apenas 5 minutos. Que alivio!

MEMÓRIA

ao largo da verdade inteira que se sente
você não quer sentir
o espaço enorme e forte que a transcende
mas há um eco ausente no presente
e um eco presente nesse ausente
que ficam a gritar no desespero
e não alcançam o sonho
de quem tudo quer viver
mas nunca mente

Faça o que fizer a si mesma por enfado
ou por raiva
ou por sonho
ou fantasia
por recusa
por cansaço
ou por agrado
há na memória dessa pele
um gesto meu
e excessos que não sinto em nenhum lado
mais que o sonho de quem tanto prometeu

e passo a passo confirmo na distância
que a vida nos ensina Arte Maior
nem êxtase nem saber nem agonia
são maiores que a dor e o sabor
no gesto repetido e fermentado
que espero e escondo sublimado
e a espaços – consentido – me foi dado
e confirmado em noites de fulgor

será a memória um gesto de renúncia?
será o medo a fonte da loucura?
creia, apalpe, sinta, viva e pense
porque aquilo que um dia o corpo sente
quando foi vivido muito intensamente

não mais desaparece

e nele perdura

PEDRO BARROSO, in “Das mulheres e do mundo”

Aliás, um sonho, minha amiga, não é uma esperança; contentamo-nos com ele; achamo-lo mesmo mais doce quando o julgamos impossível, porque não se tem então a inquietação de vivê-lo um dia.

MARGUERITE YOURCENAR, in “Alexis ou o Tratado do Vão Combate”

“Até à II Guerra, Macau foi uma plataforma do comércio internacional de ópio, apesar de a sua participação na Conferência de Xangai (1909) o obrigar a restringir esse comércio a prazo. No entanto, como resistir ao apelo de tantos milhões de consumidores chineses?”

ALFREDO GOMES DIAS “Macau e a questão do ópio”, in “História, Junho de 2005

Porto, 14 de Julho de 2005

Free Web Counter
Site Counter