POESIA AO AMANHECER
Bom dia, meus bons e leais Amigos
Depois de amanhã é a comemoração da festa e todos nós nos perguntamos, onde estavas há trinta anos?
Nos 15 dias que antecederam a Revolução eu estava internado num hospital dos arredores de Moscovo para fazer uma intervenção cirúrgica relativamente simples. O edifício ficava no interior de uma floresta de bétulas a perder de vista. Nos últimos dias podia sair e passear por aquela imensidão de árvores. No dia 23 ao fim da tarde enquanto lanchava com o meu companheiro de quarto e víamos o pôr-do-sol, com saudades da pátria, dizia-lhe que onde o sol encontra o mar fica Portugal. No dia 24 à hora do almoço tive alta e uma carrinha veio buscar-me. No interior vinha também uma tradutora de árabe que falava francês. Era linda de morrer. Chamava-se Elena e tinha olhos cor de amêndoa. Durante dez meses tinha os olhos derretidos de olhar para ela, mas nem me atrevia a aproximar-me. Vocês estão a ver, bonito como sempre fui e com uns óculos graduados de 10 dioptrias que lhe davam aquela forma de cebola nos extremos era um quadro que desanimava qualquer um. Pois é, mas a jovem percebeu a mensagem daqueles meses todos e quando entrei no carro foi ela a puxar conversa. No dia seguinte, 25 de Abril à uma hora da tarde estava eu sentado no bar a tomar café quando aquela menina vem pedir licença para se sentar na minha mesa. Pois, estava eu ainda a recuperar o fôlego quando aparece a tradutora de português a dizer que tinha ouvido uma notícia na rádio e fixou três palavras, Portugal, golpe de estado e Spínola. Lá se foi a Elena. Passei a tarde na sala do telex a acompanhar a revolução. Segui assim todos os acontecimentos via Reuters, UPI e outras. À noite no meio de uma alegria imensa nem queríamos acreditar. Antes de adormecer e ao pensar no futuro não contive as lágrimas. Foi a última vez que chorei. Daí para a frente, só molho a alma. Três meses depois deixava a Escola às 5 da manhã com o sol já intenso a brilhar. Ao descer as escadas cruzei-me com aquela Elena linda por quem nunca deixei de estar apaixonado. Ainda atravessei a Europa clandestino, mas a 20 de Julho um comboio que entrou pela Beira Alta trouxe-me livre como nunca tinha sido e como nunca mais hei-de deixar de ser.
CANÇÂO DO SOLDADO NO CERCO DO PORTO
Sete balas só na mão
Já começa a amanhecer
Sete flores de limão
Para lutar até vencer
Sete flores de limão
Para lutar até morrer
Já estremece a tirania
Já o sol amanheceu
Mil olhos tem o dragão
Há chamas de oiro no céu
Abre no peito o luar
Companheiros acercai-vos
Arde em nós a luz do dia
Companheiros revezai-vos
Já o rouxinol cantou
Tomai o nosso estandarte
No seu sangue misturado
Já não há desiguldade
Sete balas só na mão
Já começa a amanhecer
Sete flores de limão
Para lutar até morrer.
URBANO TAVARES RODRIGUES, in "O Nosso Amargo Cancioneiro"
" - No deserto está-se um bocado sozinho...
- Também se está sozinho ao pé dos homens - disse a serpente."
ANTOINE SAINT-EXUPÉRY, in "O Principezinho"
"Acesso à educação - nomeadamente superior -, presença no mercado de trabalho, controlo dos nascimentos: em apenas algumas décadas, a condição das mulheres em terras do Islão foi profundamente convulsionada. No entanto, cada uma destas conquistas esbarra com resistências; as mentalidades são mais difíceis de mudar que as leis. De Marrocos ao Irão, os movimentos de mulheres, divididos em múltiplas correntes (laicas, liberais, islamitas) questionam tradições ancestrais, reivindicam mais direitos e procedem a uma releitura do Corão e da história muçulmana. Fazem-no por vezes de um modo disperso e, outras vezes, numa espantosa unidade."
WENDY KRISTIANASEN, "Debates entre mulheres em terras do Islão", in "Le Monde Diplomatique", Abril de 2004.
Porto, 23 de Abril de 2004
Depois de amanhã é a comemoração da festa e todos nós nos perguntamos, onde estavas há trinta anos?
Nos 15 dias que antecederam a Revolução eu estava internado num hospital dos arredores de Moscovo para fazer uma intervenção cirúrgica relativamente simples. O edifício ficava no interior de uma floresta de bétulas a perder de vista. Nos últimos dias podia sair e passear por aquela imensidão de árvores. No dia 23 ao fim da tarde enquanto lanchava com o meu companheiro de quarto e víamos o pôr-do-sol, com saudades da pátria, dizia-lhe que onde o sol encontra o mar fica Portugal. No dia 24 à hora do almoço tive alta e uma carrinha veio buscar-me. No interior vinha também uma tradutora de árabe que falava francês. Era linda de morrer. Chamava-se Elena e tinha olhos cor de amêndoa. Durante dez meses tinha os olhos derretidos de olhar para ela, mas nem me atrevia a aproximar-me. Vocês estão a ver, bonito como sempre fui e com uns óculos graduados de 10 dioptrias que lhe davam aquela forma de cebola nos extremos era um quadro que desanimava qualquer um. Pois é, mas a jovem percebeu a mensagem daqueles meses todos e quando entrei no carro foi ela a puxar conversa. No dia seguinte, 25 de Abril à uma hora da tarde estava eu sentado no bar a tomar café quando aquela menina vem pedir licença para se sentar na minha mesa. Pois, estava eu ainda a recuperar o fôlego quando aparece a tradutora de português a dizer que tinha ouvido uma notícia na rádio e fixou três palavras, Portugal, golpe de estado e Spínola. Lá se foi a Elena. Passei a tarde na sala do telex a acompanhar a revolução. Segui assim todos os acontecimentos via Reuters, UPI e outras. À noite no meio de uma alegria imensa nem queríamos acreditar. Antes de adormecer e ao pensar no futuro não contive as lágrimas. Foi a última vez que chorei. Daí para a frente, só molho a alma. Três meses depois deixava a Escola às 5 da manhã com o sol já intenso a brilhar. Ao descer as escadas cruzei-me com aquela Elena linda por quem nunca deixei de estar apaixonado. Ainda atravessei a Europa clandestino, mas a 20 de Julho um comboio que entrou pela Beira Alta trouxe-me livre como nunca tinha sido e como nunca mais hei-de deixar de ser.
CANÇÂO DO SOLDADO NO CERCO DO PORTO
Sete balas só na mão
Já começa a amanhecer
Sete flores de limão
Para lutar até vencer
Sete flores de limão
Para lutar até morrer
Já estremece a tirania
Já o sol amanheceu
Mil olhos tem o dragão
Há chamas de oiro no céu
Abre no peito o luar
Companheiros acercai-vos
Arde em nós a luz do dia
Companheiros revezai-vos
Já o rouxinol cantou
Tomai o nosso estandarte
No seu sangue misturado
Já não há desiguldade
Sete balas só na mão
Já começa a amanhecer
Sete flores de limão
Para lutar até morrer.
URBANO TAVARES RODRIGUES, in "O Nosso Amargo Cancioneiro"
" - No deserto está-se um bocado sozinho...
- Também se está sozinho ao pé dos homens - disse a serpente."
ANTOINE SAINT-EXUPÉRY, in "O Principezinho"
"Acesso à educação - nomeadamente superior -, presença no mercado de trabalho, controlo dos nascimentos: em apenas algumas décadas, a condição das mulheres em terras do Islão foi profundamente convulsionada. No entanto, cada uma destas conquistas esbarra com resistências; as mentalidades são mais difíceis de mudar que as leis. De Marrocos ao Irão, os movimentos de mulheres, divididos em múltiplas correntes (laicas, liberais, islamitas) questionam tradições ancestrais, reivindicam mais direitos e procedem a uma releitura do Corão e da história muçulmana. Fazem-no por vezes de um modo disperso e, outras vezes, numa espantosa unidade."
WENDY KRISTIANASEN, "Debates entre mulheres em terras do Islão", in "Le Monde Diplomatique", Abril de 2004.
Porto, 23 de Abril de 2004
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