Sede de Infinito

Infinito é o que se encontra para além de tudo, do conhecimento, da imaginação, do alcance da mão. Ter sede do que se encontra para lá da linha do horizonte é a imensa vontade de alcançar o que não vemos, o que não possuímos, o que não conhecemos, é por fim, uma forma de perseguir o saber e o conhecimento, se assim o desejarmos, conduzir o sonho através do tempo.

27 novembro, 2010

LEITURAS


Cada vez que Paul Theroux faz uma viagem, o resultado é inconfundivelmente…
Paul Theroux. E ele nunca foi tão bom como em O Velho Expresso da Patagónia.
Tudo começou com uma viagem no metro de Boston, à hora de ponta, até à South Station, de onde partiu no comboio Lake Shore Limited para Chicago. O que se seguiu foi uma longa descida do continente americano, que culminou com o percurso no velho expresso da Patagónia - «uma espécie de samovar demencial sobre rodas» -, que o levou a uma terra desolada, de montanhas ressequidas e arbustos espinhosos. Mas esta foi também uma viagem literária, em que procurou (e encontrou) Jorge Luís Borges, a quem teve o privilégio de ler trechos de Stevenson.
Nas palavras de Paul Fussel, jornalista do New York Times Book Review, «como a boa conversação, um bom livro de viagem consiste em dois tipos de material: narrativa e comentário. Os comentários de Theroux aparecem sob a forma de pequenos ensaios. Mas por muito interessantes que sejam estas incursões, a sua narrativa é melhor, e o seu diálogo, então, é o melhor de tudo».

Paul Theroux nasceu em Medford, no Massachusetts, em 1941. Passou cinco anos em África antes de partir para Singapura, onde foi professor universitário.
Entre os livros que publicou contam-se, Riding the Iron Rooster, Chicago Loop, Picture Palace (prémio literário Whitebread em 1978), e The Mosquito Coast (que ganhou ex-aequo o James Tait Black Memorial Prize); e ainda The Elephanta Suite, The Great Railway Bazaar e Ghost Train to the Eastern Star, que serão publicados pela Quetzal em 2009 e 2010.
Paul Theroux é casado, tem dois filhos e vive no Havai.

É um prazer descer o continente americano na companhia de Theroux. A diversidade dos lugares a especificidade das gentes, os costumes, as tradições, quotidianos tão diferentes a surpreender, umas vezes de forma negativa, outras positivamente. O esplendor das paisagens, os comportamentos a ritmos tão diversos e a história a pesar sobre presentes que nos parecem passado. Nota-se, aqui e ali o incómodo civilizacional do viajante e ao mesmo tempo o esforço para compreender, perceber e olhar sem aquela crítica simples e negativa. No fundo, a viagem que todos aqueles que se debruçam sobre o maravilhoso da vida e das pessoas desejariam fazer e essa travessia andina roça-nos a fantasia, desde as florestas amazónicas ao planalto boliviano com um final em plena secura patagónia é algo para não mais esquecermos.

24 novembro, 2010

POESIA


Caminho na estrada
desenhada pela sombra
da tua última visita.
Ergo um arco de festa
para receber as
palavras que recordo de ti
e emboscado
combato em defesa
da alegria
que vive nos teus olhos.

22 novembro, 2010

POESIA AO AMANHECER


Bom dia, meus Amigos

Já o tenho dito, embora pense que repeti-lo não faz mal, que quando andamos por aí com alguma atenção, aqui e ali, descobrimos pessoas muito interessantes, no falar, no escrever, na forma como reflectem sobre a vida e muitas outras coisas. No fundo, pessoas encantadoras que nos cativam e que em alguns casos, quando chega o momento, quase nem nos apetece partir, tal o encantamento que nos deixam. Na maioria das vezes, a surpresa é ainda maior, pelo facto de as encontrarmos onde menos esperamos e quando ao primeiro olhar, nem tínhamos reparado nelas. Vem isto a propósito de ontem deparar com um texto que me deixou a viver um daqueles momentos mágicos que por vezes apanhamos no ar. Pela beleza e simplicidade das palavras. Alguém decidiu sintetizar os pontos positivos e negativos de uma reunião através de um poema, feito prosa. A primeira sensação que tive na leitura foi de me apetecer abraçar esse alguém que escrevia de forma tão leve e tão rica, afagar o rosto de alguém que nos pode deixar tão feliz com a vida. Mas como não podia, socorri-me das palavras que de seguida vou transcrever. Foi o que me ocorreu ao pensamento perante o texto que li e que um dia quiçá vos deixarei ler. É uma pena que o autor queira permanecer anónimo e terei de respeitar essa vontade. Possivelmente alguns de vós identificareis a pessoa face às palavras que escrevi, mas não tenho receio, pois sois os meus leais companheiros destes amanheceres que se querem tranquilos.
Nós quase não nos conhecemos, apesar de pensar que nos tratamos por tu. Sei que se chama Ana que é um nome bonito. Tem também Cristina que pode transmitir uma aparência de maior fragilidade, mas Guerreiro complementa e endurece o que poderia parecer leve. A mistura dos três dá a doçura e a beleza destas palavras que acabei de ler e que tão bem reflectem o que vi, mas pouco disse, porque alguma coisa disse, ao meu Director, mas sem poesia que estava zangado. A Ana também estava, di-lo com amargura, mas com calma, chega a sorrir no meio da sua reflexão e, certamente deixou até que o olhar se perdesse ao longe pelas águas calmas da albufeira, imaginando vidas diferentes, mundos diversos e seres humanos com mais moral do que materialidade. Mas se existem, poucos estariam por lá. Os restantes nem paisagem seriam, pois esta era demasiado soberba para que se deixasse em lugar secundário. O resto foi o que se viu, um pouco de vazio aqui, muita secura mais além, quase nada de nada, muitas palavras atiradas ao vento e nem sequer emoções foram criadas. Se a alma levava esperança, esvaiu-se ainda pelo caminho, pois de intenções já nós enchemos a vida e não podemos encher mais nada. No fim, nem despedida chegou a ser, foi mais partida, sem regresso e quase sem destino. Apenas estrada e nem esta era nossa. Quando olhamos para trás e tentamos recordar temos essa desilusão de nada sentir, da brevidade do tempo e da escassez das ideias que sobrevoaram aquele templo quase perdido num lugar que só recordamos o nome porque poucos lá regressarão. A caminhada continua como quase sempre e com as mesmas notas dispersas, mas, agora, sabemos que, algo aconteceu, pelo menos, um pormenor valeu a pena, a possibilidade de três meses depois bebermos tão bela escrita, feita de palavras de sonho.

DIONYSOS

Entre as árvores escuras e caladas
O céu vermelho arde,
E nascido da secreta cor da tarde
Dionysos passa na poeira das estradas.

A abundância dos frutos de Setembro
Habita a sua face e cada membro
Tem essa perfeição vermelha e plena,
Essa glória ardente e serena
Que distinguia os deuses dos mortais.

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in “Cem Poemas de Sophia”

Talvez seja melhor não nos apercebermos das lágrimas, quando não as podemos consolar.

MARGUERITE YOURCENAR, in “Alexis ou o Tratado do Vão Combate”

“O fracasso do Conselho Europeu de Bruxelas, a 16 e 17 de Junho de 2005, tem causas muito anteriores ao «não» francês e holandês. Tal como foi concebida, a União atingiu os seus limites. A política do euro é disso um bom exemplo: à margem da democracia, fundada num dogma monetarista obsoleto, ela impede qualquer promoção do emprego. Longe de ser acidental, a rejeição desta Europa traduz um corte filosófico entre dirigentes e cidadãos. E só dos cidadãos poderá nascer uma refundação democrática da Europa.”

BERNARD CASSEN “Por uma Europa da inovação democrática”, in “Le Monde diplomatique”, Julho de 2005

Porto, 22 de Julho de 2005

21 novembro, 2010

LEITURAS


Bem ao estilo de Gabriel García Márquez, este livro reúne sete histórias mágicas que reflectem a cultura sul-americana. As primeiras, um conjunto de seis contos fantásticos onde se misturam acontecimentos surreais e detalhes do quotidiano, contam-nos as alterações sofridas por pequenas e pobres povoações após estranhos acontecimentos que mudam a vida de todos os habitantes.
A última, a novela curta que dá título ao livro, conta a história de Eréndira, uma adolescente obrigada a prostituir-se pela própria avó para a recompensar das perdas decorrentes de um incêndio acidental – um bizarro mas poderoso exemplo do realismo mágico de García Márquez.

Este livro excepcional reúne a novela curta que lhe dá o título e outros seis contos, os quais, à excepção de «O Mar do Tempo Perdido» (1961), pertencem à fase de plena maturidade de Gabriel García Márquez, alcançada com Cem Anos de Solidão. Foram os anos em que Macondo lhe abriu as portas do realismo mágico, e estas narrativas são as primeiras provas deste novo mundo que o autor descobrira já completamente. A frase torna-se mais larga e caudalosa, a realidade expressa-se mediante fórmulas mágicas e lendárias, os milagres inserem-se na vida quotidiana e a prosa aproxima-se inevitavelmente do seu destino fatal: a poesia. A Cândida Eréndira e a sua avó desalmada personificam a inocência e a maldade, o amor e a sua perversão, e a narrativa lembra ao mesmo tempo as gestas medievais e as cantigas provençais ou trovadorescas, ainda que, como sempre, imersas nesse mundo denso e frutífero do Caribe americano.

Gabriel García Márquez nasceu em Aracataca, Colômbia, a 6 de Março de 1927. Considerado o pai do realismo mágico latino-americano, foi essencial para o reconhecimento da literatura americana em língua castelhana no resto do mundo, principalmente depois da atribuição do Prémio Nobel da Literatura, em 1982. O carácter universal da sua obra coloca-o entre os maiores nomes da literatura.
É autor de uma vasta bibliografia que a Dom Quixote tem vindo a publicar regularmente, incluindo o primeiro volume da autobiografia Viver para Contá-la, O Aroma da Goiaba (conversas com Plinio Apuleyo de Mendoza) e a reedição de Olhos de Cão Azul, com três contos inéditos em Portugal.

Que mais dizer de García Márquez, autor que me fascina há trinta anos, me deslumbra, me faz mergulhar nesse mundo do sonho e da fantasia, me fez perder de amores e engrandecer as mulheres amadas. Ao fim de tantos anos volto a reencontrá-lo numa leitura já quase totalmente lida. É o encanto de novo em cerca de cento e cinquenta páginas.

POESIA


Amo
a tua voz e a tua cor.
Perdi-me do mundo
na geografia dos teus olhos.
Pinto o mar
com o silêncio
da tua ausência
e sinto em ti
a voz
da minha alma
chamando-te.

01 novembro, 2010

POESIA AO AMANHECER


Bom dia, meus Amigos

Eu queria cantar/cantar uma canção/feita de sol e de mar/ feita só com o coração. Já não sei quando foi, mas um dia levantei-me cedo e fui acordar o sol e a estrela ergueu-se brilhante e magnífica numa bola de fogo pelo cimo da colina e enquanto o Pedro Barroso cantava, dirigi-me às margens do Tejo à conquista da capital. Levava comigo apenas palavras, a força das palavras, não de quaisquer palavras, mas as que carregam, justiça e razão, humanidade, sentimentos, valores éticos e morais e ali chegado estendi-as ao longo da mesa, com lentidão, pesando cada uma delas para ter a força que desejava e necessária para ser compreendida. Senti a leveza do sonho a distender-se e nem o calor abrandou a vontade de falar. Claro, que para as nossas palavras terem sucesso é necessário que alguém as escute e as compreenda, mas na verdade, encontrei quem me ouvisse. Não vos vou contar o resto da história, porque não posso e porque ainda não acabou, mas quando o comboio rumou ao norte, sei apenas que trazia a alma cheia de esperança, não a vulgar, mas aquela que se vê no horizonte como algo que se pode alcançar com a mão e abraçar num misto de missão cumprida e de sentimento de que valeu a pena. Um dia, poderemos olhar para o longe, sentir o futuro seguro e então teremos tempo de deixar uma lágrima teimosa e feliz correr pela face, mas hoje, não. Hoje, apenas quero cantar uma canção/feita de sol e de mar/feita só com o coração.

VOZ ACTIVA

Canta, poeta, canta!
Violenta o silêncio conformado.
Cega com outra luz a luz do dia.
Desassossega o mundo sossegado.
Ensina a cada alma a sua rebeldia.

MIGUEL TORGA

Obrigávamo-nos às práticas de uma devoção exaltada, que já não correspondia às nossas verdadeiras crenças: aqueles a quem tudo falta recorrem a Deus e é nesse momento que também Deus lhes falta.

MARGUERITE YOURCENAR, in “Alexis ou o Tratado do Vão Combate”

“Mas esta não é, não pode ser, apenas a história de um homem. Esta é a história de uma sociedade que colectivamente permitiu que a demagogia crescesse até ao delírio, que a monstruosidade se instalasse nas ruas, nas casas e nos campos de concentração. Não venham com a desculpa do “nós não sabíamos!” Todos sabíamos. Era público e notório. Uns não saberiam o que se passava em Auschwitz, mas não ignoravam o que se passava na sua rua, com a loja do judeu fechada, ou o vizinho comunista deportado, com a queima de livros proibidos ou os “ghetos”. Todos sabiam e quase todos concordaram tacitamente, quando não aplaudiram mesmo nas imensas paradas que reuniam milhares e milhares de soldados e testemunhas activas.
Não nos venham dizer que a secretária pessoal de Hitler, com os seus vinte e poucos estouvados anos, não sabia de nada do que se passava e admirava a humanidade do Fürher. Todos os que pactuavam e todos os que se revoltavam sabiam. Todos sabemos hoje o que se passa nos campos de concentração de prisioneiros iraquianos. Todos sabemos o que se passa com os reféns degolados pelos árabes. Todos sabemos o que Paul Auster nos conta sobre as perseguições diárias a anódinos cidadãos árabes, hoje, agora, neste instante, nos EUA. Todos sabemos o que se passa em certas regiões da África, da Ásia, da América do Sul. Ou sabemos com provas, ou imaginamos. Os que não sabem, por desinformados, não são melhores que os outros. Meter a cabeça na areia nunca ajudou a avestruz.”

LAURO ANTÓNIO “A Queda. Hitler e o fim do III Reich”, in “História”, Junho de 2005

Porto, 21 de Julho de 2005

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